De todas as tarefas que o Grupo de Peritos Técnicos (TEG) em finanças sustentáveis da Comissão Europeia realizou nos últimos anos, a criação de índices de referência verdes para investimentos foi provavelmente a mais importante.
- Os benchmarks verdes são projetados principalmente para auxiliar na avaliação de oportunidades de investimento segundo uma lista de fatores baseados no clima.
- Eles serão agregados a uma estratégia mais ampla de financiamento sustentável da Comissão Europeia (CE).
- Alguns investidores, contudo, ainda estão em dúvida quanto à simplicidade das diretrizes desses índices de referência –e até que ponto eles continuarão permitindo o “greenwashing“.
Após um longo período de trabalho do Grupo de Peritos Técnicos (TEG) em finanças sustentáveis da Comissão Europeia (CE) –que desde julho de 2018 vem se dedicando a montar uma estrutura, consultar legisladores e as diversas partes afetadas para propor uma nova legislação—, um projeto de ato delegado foi finalmente publicado em abril de 2020 para consideração pública.
Em 17 de julho de 2020, a CE adotou oficialmente os regulamentos técnicos, responsáveis por estabelecer os requisitos mínimos para a metodologia que regerá a “Transição Climática da UE”, “benchmarks da UE alinhados ao Acordo de Paris” e divulgações relacionadas à sustentabilidade.
Essas normas técnicas entraram em vigor em 23 de dezembro de 2020 e irão se juntar à estratégia financeira sustentável mais ampla da UE assim que os outros pilares (taxonomia, títulos verdes e divulgação) estiverem em funcionamento.
E, como evidenciado por um estudo recente da FTSE Russell, esses regulamentos permitirão a imediata construção de índices que podem atingir os objetivos do TEG, mantendo-se, ao mesmo tempo, flexíveis para quaisquer ajustes futuros que vierem a ser necessários.
Saiba mais sobre os FTSE EU Climate Benchmark Indexes
Para que servem os benchmarks verdes?
Os benchmarks verdes foram projetados principalmente para ajudar na avaliação de oportunidades de investimento de acordo com uma lista de fatores relacionados ao clima. Também se espera que eles abordem o risco de “greenwashing” (traduzido em português como “maquiagem verde” ou “lavagem verde”), prática pela qual produtos financeiros são comercializados como “verdes” ou “sustentáveis” apesar de não atenderem aos padrões básicos para tal.
Esses índices de referência vêm em duas versões, permitindo assim que os seus provedores ofereçam benchmarks compatíveis tanto com a Transição Climática da UE (EU CTBs) quanto com as disposições delineadas no Acordo de Paris da COP 21 (PABs da UE).
Isso indica que, em suma, os benchmarks compilados por terceiros terão que estar de acordo com várias regras para serem rotulados como índices climáticos da UE. Entre elas, a mais importante é a necessidade de equilibrar quaisquer alocações a setores ou empresas que contribuam fortemente para a mudança climática (como companhias de extração de petróleo ou que tenham instalações movidas a combustíveis fósseis) com o resto de seus portfólios.
Além disso, os índices que desejarem receber o selo da UE também terão que excluir ativos que “prejudiquem significativamente” os objetivos ESG mais amplos.
Há muitos detalhes sobre o que isso quer dizer em termos estritamente técnicos, mas, em resumo, significa que qualquer coisa rotulada como “benchmark climático” deve se responsabilizar pelo rastreamento de empresas de tabaco, fabricantes de armas controversos e quaisquer empresas que violem o Pacto Global da ONU. Também é preciso relatar uma série de outros fatores ESG, incluindo equilíbrio de gênero na força de trabalho, como conselhos e equipes de gestão; práticas de due diligence; esforços anticorrupção; e boas políticas de governança corporativa.
Outro ponto importante são as divulgações de emissões de gases de efeito estufa. Essas devem incluir dados de Escopo 1, 2 e 3 e ser pelo menos 30% mais baixas (ou 50% para Paris-Aligned Benchmarks (PABs) mais rígidos) do que as emissões do universo geral de investimentos. Uma “proporção de participação verde/marrom” que rastreia como os ativos são descarbonizados é outra ferramenta que pode ser incluída nas regras.
O que isso muda para os investidores?
A Comissão Europeia afirma que, ao utilizar métricas como intensidade dos gases de efeito estufa e capitalização de mercado para a seleção de ativos, garante uniformidade entre setores e não discrimina determinadas indústrias.
O estudo da FTSE Russell, já mencionado acima, analisou um PAB da UE (o FTSE All-World Paris-Align Benchmark) e, conforme estabelecido pelo TEG, empregou a estrutura de Exposição Alvo FTSE durante um período de 10 anos (de 2009-2019). A pesquisa descobriu que o Índice FTSE All-World PAB resultante alcançou uma redução de emissões de carbono de 50% quando comparado ao Índice FTSE All-World –e que, ao final de 2019, as emissões estavam na metade do nível de 2009, atendendo ao requisito da UE de cortá-las em 7% ao ano.
Outros benefícios do índice FTSE All-World PAB incluem: o dobro da proporção de rendimentos verdes em comparação ao índice FTSE All-World; habilidade de incorporar avaliações prospectivas dos riscos climáticos à frente das empresas; e capacidade de estender a abordagem para atender aos requisitos do CTB, conforme também estabelecido no relatório do TEG.
Yang Wang, o principal autor do estudo, escreveu que o índice construído “foi capaz de atingir todos os objetivos exigidos no relatório do TEG e de examinar as fontes de desempenho superiores ao longo do período”.
Alguns investidores dizem que é uma abordagem contundente em alguns aspectos, sobretudo no que diz respeito a como a estrutura propõe índices ponderados de capitalização de mercado em relação à descarbonização. Já outros dizem que seria possível ir além, e pedir que as trajetórias de emissões levem em consideração os resultados econômicos reais, em linha com outras iniciativas importantes.
E, como destacou um comunicado da State Street Global Advisors, a implementação dos regulamentos técnicos do TEG provavelmente levará a alguma disrupção. “Para investidores que atualmente não contam com nenhuma forma de gestão de risco climático, isso será ainda pior”, acrescenta a SSGA. “Além disso, o objetivo de atender aos novos requisitos de referência climática deverá tornar a construção do portfólio e as estratégias de investimento mais complicadas”.
Próximos passos dos benchmarks verdes
Essa consciência, no entanto, não impediu que outros gestores de ativos integrassem as recomendações em seus próprios planos de transição climática. Um exemplo é o Lombard Odier Investment Managers (LOIM), cuja nova estratégia de capital verde foi baseada no trabalho da Comissão Europeia sobre referências climáticas e pela taxonomia verde. “Essa é uma das várias providências que estamos adotando em toda a empresa para alinhar os portfólios e capturar as oportunidades de investimento decorrentes da transição climática”, declarou Hubert Keller, sócio-gerente da LOIM.
Desde julho de 2020, vários provedores vêm oferecendo benchmarks alinhados à União Europeia. A FTSE Russell, por exemplo, lançou seus índices PABs em 31 de maio. A série de benchmarks foi projetada para refletir o desempenho dos índices do mercado acionário global, regional e doméstico, em que os constituintes são alternativamente ponderados para buscar o alinhamento com as metas do Acordo Climático de Paris de 2015.
Compreender os requisitos desses benchmarks é de suma importância para tomar decisões de investimento mais sensatas. E, para alinhá-las aos regulamentos técnicos da UE, é necessária uma análise mais profunda dos portfólios. É provável, no entanto, que essas diretrizes ainda passem por alguns ajustes, que devem abordar, por exemplo, a maneira como se mede a descarbonização e a prevenção da “lavagem verde”. Vejamos!