Algumas das quedas mais fortes já vistas nos mercados da China, enormes aumentos nos preços da energia e sinais mais claros de que os bancos centrais estão começando a fechar as torneiras de dinheiro golpearam os mercados mundiais neste trimestre.
Uma repressão regulatória na China fez evaporar 1 trilhão de dólares de seus mercados e empurrou gigantes como Alibaba a um mergulho de 30%, em seu pior trimestre já registrado, enquanto a empresa imobiliária Evergrande –uma das maiores emissoras de dívida “high-yield” do mundo– está à beira de um calote.
Ao mesmo tempo, as ações mundiais estão caminhando para o primeiro trimestre de perdas desde que a Covid-19 começou a cobrar seu preço, no início do ano passado. Os títulos tiveram um mês de setembro instável, em meio a conversas sobre corte de estímulos monetários, e o dólar, tido como porto seguro, está em seu melhor ano desde 2015.
Paralelamente, a inflação está ganhando força com o aumento dos custos de commodities e de fretes. O gás natural disparou quase 60% desde julho e 120% no acumulado do ano, o café subiu 25% pelo segundo trimestre consecutivo, e os custos de frete saltaram mais 40%.
Emmanuel Cau, chefe de ações europeias do Barclays, avalia que os mercados estão precificando o fim do cenário ‘Cachinhos Dourados’ –quando o crescimento e a inflação não são nem muito altos nem muito baixos–, então investidores devem estar cientes dos “bears” –ursos, em inglês, termo utilizado para se referir a investidores com posições pessimistas nos mercados, devido ao movimento para baixo que os ursos fazem com as garras ao atacarem.
“O fim do terceiro trimestre é de certa forma um gostinho do que está por vir, com os bancos centrais começando a mudar as políticas monetárias”, disse Cau, observando uma “mudança brutal de regime” à medida que investidores mudam de setores como tecnologia para as chamadas ações de valor, como bancos e energia.
“Também é preciso levar em conta que o crescimento chinês será mais fraco no futuro.”
China Esmagada
O maior drama foi nos mercados chineses, onde a repressão a empresas de tecnologia, digitais e de educação com fins lucrativos se intensificou, seguida pelo colapso da Evergrande.
Tudo isso gerou uma perda de quase 1 trilhão de dólares em valor no mercado acionário chinês, tombo de 70% nas ações da Evergrande e prejuízo de 14% para quem quer que tenha investido em dívida corporativa chinesa de alto rendimento.
As preocupações com a China impunham ao índice MSCI de ações emergentes queda de quase 10%, após cinco trimestres de ganhos. O desempenho inferior em relação a Wall Street era de impressionantes 30 pontos percentuais.
“Este foi um dos períodos mais destrutivos em termos de valor dos mercados acionários chineses na história”, disse William Mileham, da gestora de ativos Mirabaud, com sede na Suíça, acrescentando que a sensação é que as pressões regulatórias podem não acabar.
O dólar em alta também complicou a vida de outros mercados emergentes, com as moedas chilena, brasileira e peruana caindo de 7% a 9% no trimestre.
A lira turca perdeu mais terreno após um recente corte surpresa na taxa de juros, permanecendo com o pior desempenho do ano.
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Ações Divergentes
Os mercados de ações mundiais estão encerrando o trimestre de forma desordenada, com o índice MSCI global em baixa de cerca de 1%, na primeira perda trimestral desde o início de 2020.
Zoom e Peloton, que se beneficiaram das mudanças de rotina impostas pela pandemia, perderam cerca de um terço de seu valor, mas as fabricantes de vacinas Moderna e Pfizer aumentaram 60% e 11%, respectivamente, e a fabricante de motores de avião Rolls Royce subiu mais de 40%.
Para muitos investidores, setembro provavelmente será lembrado como o fim de um conto de fadas financeiro, quando o estímulo fiscal e monetário, combinado com o crescimento dinâmico e a inflação moderada, empurrou implacavelmente os preços das ações para níveis recordes.
O aumento dos rendimentos já provocou uma rotação brutal nas carteiras de ações, uma vez que gestores trocaram as ações de crescimento e de tecnologia por papéis mais baratos nos setores bancário e de petróleo e gás.
O Nasdaq caía 2% no trimestre, mas perdia cerca de 4,5% em setembro, com analistas “sell-side” incentivando seus clientes a buscar “valor” e eliminar o risco das FAANGS (grupo formado por grandes empresas de tecnologia). Até a Amazon perdeu terreno.
“É um momento muito, muito desafiador para montar uma carteira”, disse Roland Kaloyan, que dirige a estratégia de ações europeias no Société Générale.
“Ao mesmo tempo, você deseja ter exposição a rendimentos em alta, proteger contra o aumento das taxas e proteger seu portfólio contra a desaceleração do crescimento na China.”
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Bônus —Sem Tempo Para Compra
Os mercados de títulos, depois de uma grande recuperação em julho, despencaram em setembro, depois de guinadas violentas do Federal Reserve e do Banco da Inglaterra, dando aos compradores de títulos soberanos uma rara perda de 1% em uma medida global.
Os vencedores claros do terceiro trimestre foram os títulos indexados à inflação na zona do euro e na Grã-Bretanha, com retornos de cerca de 3% cada, de acordo com índices ICE BofA. Esses papéis estão se beneficiando de temores de que a inflação –estimulada por interrupções na cadeia de suprimentos e escassez de mão de obra– seja menos transitória do que o que vem sendo sinalizado.
Globalmente, já ocorreram mais de 50 aumentos separados nas taxas de juros neste ano, liderados por focos críticos de inflação nos mercados emergentes, como Brasil e Rússia.
Nos mercados de crédito, longe da turbulência da China, a dívida corporativa “junk” (sem grau de investimento) denominada em euro com as mais baixas classificações –em CCC ou abaixo– gerava retorno em torno de 1,4%, à medida que as empresas continuam a se recuperar da pandemia.