Ir para conteúdo

Na jornada rumo ao Net Zero, dependemos de infraestrutura e commodities metálicas para pavimentar o caminho

Alessandro Sanos, CAIA
Alessandro Sanos, CAIA
Global Director, Commodities, Refinitiv

Em meio à transição energética, nos deparamos com problemas nos mercados de commodities e de infraestrutura sustentáveis. Como contornar esses desafios para alcançar o Net Zero?


  1. “Pontos cegos” e gargalos nos mercados de commodities e de infraestrutura estão tornando a transição para o Net Zero muito mais complexa do que se previa.
  2. Além de o setor de infraestrutura carecer de novas formas de financiamento, ainda precisamos lidar com a escassez de metais e minerais essenciais para o processo global de eletrificação.
  3. E não há saída: eficiência energética é a chave para ganhar tempo diante da crise climática, já que é a maneira mais rápida de reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

Para mais informações baseadas em dados diretamente no seu inbox, assine o boletim semanal Refinitiv Perspectives

Em apenas dois anos, desde sua pior baixa, no início da pandemia, o preço do lítio disparou de US$ 5.500 (por tonelada) para US$ 80.000. Isso ocorreu porque a demanda pelo mineral, impulsionada sobretudo pela fabricação de veículos elétricos, encontra-se muito acima do atual nível de oferta.

Existem reservas abundantes de lítio ao redor do planeta, em países como Austrália, Bolívia, Chile, China e Argentina, mas hoje em dia não há capacidade de mineração suficiente. Além disso, três quartos das instalações de processamento do mundo estão localizadas na China, o que pode causar problemas na cadeia de suprimentos.

Seja na construção de infraestrutura sustentável ou no fornecimento de metais e minerais, existem “pontos cegos” e gargalos que estão tornando a transição dos combustíveis fósseis para a eletrificação mais complexa do que muitos imaginavam. Pelo menos, essa é a opinião dos especialistas que participaram de um recente webinar promovido pelo LSEG.

Em última análise, eles acreditam que a maioria dessas dificuldades pode, sim, ser superada, mas apenas se houver uma maior apreciação e atenção para as realidades envolvidas nessa transição.

Intitulado The Impact on Global Commodities & Infrastructure Markets (O Impacto nos Mercados Globais de Commodities e Infraestrutura), o webinar ocorreu em 31 de outubro de 2022, uma semana antes da conferência climática COP27 da ONU. Com a participação dos principais especialistas do LSEG em infraestrutura, metais e gás natural, o evento abordou, entre outros assuntos, os fatores que, a princípio, estão envolvidos no processo de substituição de combustíveis fósseis por energia renovável. Leia a seguir, um resumo dos tópicos discutidos no webinar.

Finanças e Investimentos Sustentáveis: descubra como as soluções financeiras sustentáveis do LSEG podem ajudá-lo a enfrentar desafios nesse setor

Deficiência em instalação de infraestrutura sustentável

Em relação à infraestrutura sustentável, é preciso lembrar que muitos projetos são anunciados, mas poucos realmente alcançam viabilidade financeira. E isso tem acontecido devido a uma complexa combinação de problemas, que envolve fatores relacionados à instalação, cadeias de suprimentos e geopolítica.

Na África, por exemplo, a infraestrutura de energia renovável poderia tornar-se maior que a de geração energética a partir de combustíveis fósseis, mas é preciso lidar com a relutância dos bancos em assumir o risco de financiar a produção independente de energia em alguns países.

De acordo com Ibukun Adebayo –diretor de Iniciativas Estratégicas, Finanças Sustentáveis e Investimentos do LSEG e um dos participantes do webinar—, apenas US$ 60 bilhões dos US$ 2,8 trilhões em capital privado arrecadado para investimento em infraestrutura global de energia entre 2000 e 2020 foram para projetos africanos. Isso representa apenas 2% do total, enquanto a África responde por cerca de 6% das emissões em todo o mundo.

“O que realmente precisamos fazer agora é focar na lacuna anual de US$ 100 bilhões em financiamento de infraestrutura que precisa ir para a África até 2030, a fim de permitir uma transição energética justa”, disse Adebayo. “Ou seja, necessitamos de mais ferramentas para isso, como o financiamento combinado ou o Mercado Voluntário de Carbono da Bolsa de Valores de Londres, para desbloquear o capital do setor privado”, acrescentou.

Recentemente, Andy Bainbridge, presidente do Private Infrastructure Development Group (PIDC), apoiou as observações do diretor do LSEG em uma entrevista com Jane Goodland no Net Zero Delivery Summit, incentivando os desenvolvedores de energia a aproveitar a oferta de aprimoramento de crédito GuarantCo do PIDC.

Mas Bainbridge também identificou uma escassez no número de projetos de energia em estágio inicial. Porém, ele acredita que a crescente atenção dispensada às mudanças climáticas pelo menos significa que os formuladores de políticas estão cientes de onde estão os problemas. “A parte boa, e que, em grande parte, é resultado da COP26, é que os problemas relacionados à preparação inicial de projetos e financiamento estão sendo, no mínimo, reconhecidos.”

Cadeias de fornecimento de commodities versus geopolítica

No que diz respeito aos mercados de commodities, as cadeias de suprimentos e a geopolítica provavelmente dificultarão a transição energética.

A volatilidade do preço do lítio ilustra claramente o desequilíbrio entre oferta e demanda, acentuado pela posição dominante da China no mercado de processamento.

“Não faz sentido ter três quartos da capacidade de processamento somente na China enquanto o mundo inteiro requer lítio para se descarbonizar”, afirmou Bruce Always, diretor da área de metais do LSEG. “Para acabar com esse déficit na oferta, os governos podem se sentir compelidos agir”, lembrou ele.

Fornecer a enorme quantidade de metais e minerais necessários para a eletrificação –que inclui expansão da rede elétrica e fabricação de baterias— é um “ponto cego” na transição energética.

“Em outras palavras, simplesmente não temos oferta suficiente de metais e minerais para atender à demanda, e só assim seria possível atingir as metas de transição especificadas pelo acordo de Paris”, destacou Alessandro Saros, diretor global de estratégia de vendas do LSEG.

Mas Saros também levantou três preocupações específicas:

    1. Em primeiro lugar, as reservas de metais e minerais são insuficientes. “Leva-se, em média, cinquenta anos desde a descoberta até o desenvolvimento de uma nova mina de cobre”, explicou ele.
    2. Além disso, restam menos depósitos de minério de alta qualidade.
    3. E, por fim, fatores geopolíticos, como guerras e outros conflitos, podem dificultar o fornecimento de metais.

Como observou, Ed Gomersall, diretor de gás natural, GNL e carvão da Refinitiv, em nenhum lugar a geopolítica é hoje mais evidente do que na Europa, onde a guerra na Ucrânia está levando à crise energética mais aguda do continente, com o fechamento de gasodutos naturais da Rússia.

Inclusive, no curto prazo, isso vem fazendo com que alguns países deixem de lado seus esforços para atingir o Net Zero –à medida que as usinas de carvão estão sendo ressuscitadas e o funcionamento de usinas nucleares destinadas ao fechamento, prorrogado, como na Alemanha.

Eficiência energética: uma solução amplamente negligenciada

Na opinião de Alessandro Saros, o debate sobre como chegar ao Net Zero está muito focado na oferta de energia, e não na eficiência energética.

“Precisamos também olhar para a demanda de energia. A eficiência energética é vital para ganharmos tempo. É a maneira mais rápida de mitigar as emissões”, afirmou.

Com os aspectos práticos da transição energética ganhando atenção, uma maior eficiência energética será uma das maneiras mais fáceis de avançar em direção ao Net Zero.

Alcançar a descarbonização total, no entanto, inevitavelmente envolverá repensar algumas das atuais suposições a respeito de onde virá o suprimento de energia renovável.

Finanças e Investimentos Sustentáveis: descubra como as soluções financeiras sustentáveis do LSEG podem ajudá-lo a enfrentar desafios nesse setor