A nova edição do Refinitiv Carbon Market Survey oferece, entre outros insights, um panorama de como as corporações veem o impacto dos mercados de carbono sobre a crise climática. Confira neste post as principais conclusões.
- Em um ano crucial para a diplomacia climática global –em meio aos preparativos para a COP26, que ocorrerá em Glasgow, Escócia, de 31 de outubro a 12 de novembro—, a Refinitiv Carbon Market Survey 2021 (ainda sem tradução para o português) aponta expectativas mais altas de preços nos principais mercados; percepção crescente de que os regimes de limite e negociação (cap-and-trade) ajudam na redução de emissões e que o custo do CO2 torna-se crucial para as decisões de investimento.
- Os preços do Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (EU ETS, na sigla em inglês) avançaram 60% este ano e estão sendo negociados acima de € 50 por tonelada. Ainda assim, o patamar está abaixo do que um quinto dos participantes da pesquisa da Refinitiv esperavam para este ano. Já as expectativas para as cotações do ETS da China, que começou a negociar suas licenças de emissão de carbono (CEAs) há cerca de um mês, são mais modestas: menos de € 5 durante o primeiro ano.
- Atualmente, o mercado de carbono voluntário é considerado a maior fonte de demanda por compensações de carbono. O apetite pelas chamadas Reduções Voluntárias de Emissões (VERs, na sigla em inglês) é muito maior do que por créditos emitidos por governos, sistemas de comércio de emissões e companhias aéreas.
O preço das licenças de emissão no Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (EU ETS) subiu mais de 60% em 2021 –de € 32, no início do ano, para os atuais € 52. Isso pode ser atribuído principalmente ao fato de a UE ter assumido metas climáticas mais ambiciosas para 2030.
Mas a valorização vista na Europa também ocorreu juntamente com movimentos em outras importantes economias do globo. Os EUA voltaram ao Acordo de Paris e, em abril, o presidente Biden prometeu cortar as emissões em 50-52% até 2030. A China, por sua vez, lançou oficialmente seu sistema nacional de comércio de emissões (ETS) em janeiro, e as negociações estrearam em 16 de julho. Enquanto isso, o Reino Unido lançava seu próprio ETS, com o primeiro leilão de licenças do país em 19 de maio.
Segundo pesquisa da Refinitiv sobre sentimento do mercado realizada em março/abril, há uma mudança notável na percepção sobre a relevância dos mercados de carbono. Para uma parcela recorde de entrevistados, o EU ETS desempenha um importante papel na redução de emissões, algo que não havia sido constatado ao longo dos dezesseis anos em que conduzimos esta pesquisa.
Neste ano, em que se espera que os países cheguem à cúpula climática internacional COP26 cheios de planos ambiciosos, nossa sondagem indica que os participantes do mercado consideram os ETS uma boa ferramenta para alcançar metas climáticas mais rígidas.
O impacto do EU ETS nos mercados de carbono
Em elevação desde 2017, o custo de uma licença de emissão de gases de efeito estufa (permissão para emitir uma tonelada de CO2 na atmosfera) atingiu um patamar histórico: mais de € 50 por tonelada. Este é o resultado de a Europa ter adotado uma política climática mais ambiciosa (redução da produção de gases de efeito estufa em 55% em relação ao níveis de 1990) e influi diretamente nas decisões de investimento das empresas, bem como em sua competitividade global, de acordo com profissionais que atuam nos setores afetados e que participaram da nova pesquisa da Refinitiv.
Como se pode observar no infográfico acima, quase 80% dos entrevistados afirmaram que as políticas climáticas são de grande importância.
Esse resultado reflete uma disposição muito mais otimista sobre o mercado de carbono do que há um ano. Quando a pesquisa anterior foi realizada, a Europa passava pelo seu primeiro lockdown e se via uma queda nos preços das commodities energéticas, incluindo o carbono.
A Refinitiv Carbon Market Survey 2021 revela expectativas mais altas de preços em mercados-chave, uma percepção crescente de que os sistemas de limite e negociação (cap-and-trade) levam a quedas nas emissões e que o custo do CO2 está se tornando crucial para as decisões de investimento.
Preços de licenças de emissão atingem novos recordes
A escalada do preço das licenças de emissão europeias foi significativa, saltando de € 19/t em 2020 para € 40/t neste ano.
As opiniões expressas na nova sondagem, realizada em março e abril passado, e os desenvolvimentos desde então mostram o quão rápida e acentuada tem sido a recuperação do mercado de carbono, que agora vê a tonelada de CO2 sendo negociada por € 50/t, bem acima das expectativas. Para se ter uma ideia da surpresa, menos de um quinto dos entrevistados esperava valores neste patamar em 2021, e um terço previa € 50 só para 2022.
Nossa pesquisa anual coleta informações de uma ampla gama de participantes e analistas do mercado e, desde 2012, incluímos um subconjunto de perguntas detalhadas destinadas aos emissores –os principais stakeholders— para entender como eles são afetados por estarem sujeitos a um sistema de comércio de emissões ETS.
Agora, um número muito maior de pessoas diz, por exemplo, que essa condição impulsiona a redução de carbono em sua organização. Além disso, 63% dos emissores pesquisados –temos aqui outro recorde— consideram o EU ETS como um fator decisivo para as decisões de investimento.
Acreditamos que esses índices demonstram que os setores industriais e de serviços europeus adquiriram uma consciência muito maior sobre o custo do carbono, e isso está estreitamente relacionado à elevação dos preços das licenças de emissão, bem como à confiança na ambição climática e no sistema de trading de emissões como ferramenta para se cumprir tal propósito.
Vale ainda observar que, entre mais de 300 entrevistados, quase metade respondeu a perguntas específicas sobre o EU ETS, mas menos de um quarto destes eram emissores.
Estreia do trading de licenças de emissão na China
A pesquisa da Refinitiv também abordou as expectativas para o mercado de CO2 chinês. O país que mais emite gases de efeito estufa no planeta já vinha trabalhando com sistemas piloto de comércio de emissões regionais (atualmente são oito deles) há anos, e um mês atrás, em 16 de julho, inaugurou o seu mercado nacional de carbono, o maior do mundo.
Os participantes de nossa atual enquete fizeram suas apostas sobre o preço das licenças de emissões no ETF chinês, e o valor médio ponderado ficou em € 4,8 para o primeiro ano de negociação –mais alto do que os € 4,2 e os € 1,9 citados pelos entrevistados em 2020 e em 2019, respectivamente.
Por enquanto, o ETS nacional cobre apenas a indústria de geração de eletricidade, mas está programado para expandir seu escopo e adicionar sete outros setores nos próximos cinco anos. Inclusive, o Ministério de Ecologia e Meio Ambiente da China sinalizou recentemente que está desenvolvendo um benchmark para o setor de cimento, indicando que este poderá ser incluído em breve.
Para cerca de 75% dos entrevistados, a indústria metalúrgica (especificamente a manufatura de ferro e aço) deverá ser contemplada a seguir. Isso porque há preocupação de que o chamado Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM, na sigla em inglês) proposto pela Europa afete as importações desses produtos se eles não estiverem cobertos pelo mercado de carbono chinês.
Entre os 303 participantes da sondagem, 86 disseram que acompanham ou estão envolvidos com o comércio de emissões da China, o que faz desta a segunda maior categoria de respostas depois da Europa (seguida por ESG, com 80 respostas).
Muitos entrevistados afirmam seguir ou estar envolvidos com mais de um mercado, e isso não coincide necessariamente com o local onde estão baseados. Por exemplo, cerca de 159 pessoas localizam-se em um país europeu, mas muitas das que se encontram fora da UE seguem o EU ETS e vice-versa.
Também vale dizer que perguntas específicas para os dois mercados de carbono da América do Norte (WCI e RGGI) obtiveram apenas algumas respostas, principalmente sobre preços (espera-se que subam) e a possível inclusão de novas jurisdições (a maioria não acredita nessa possibilidade).
Já em relação ao mercado nacional de carbono da Coreia do Sul (os KETS), a pesquisa mostra uma perspectiva de preços baixistas para 2021. Acredita-se que o valor por tonelada permanecerá no nível atual, de € 13. Enquanto isso, as cotações no ETS da Nova Zelândia têm tendência de alta, entre NZ$ 40 e NZ$ 45/ t (~ € 24-27/t).
Redução voluntária de emissões: uma tendência
A Refinitiv Carbon Market Survey 2021 também se debruça sobre o crescente mercado de compensações climáticas adotadas pelas companhias aéreas para o cumprimento do programa CORSIA, que foi estabelecido pela Organização de Aviação Civil Internacional e tem o objetivo compensar o aumento das emissões da aviação internacional. A maioria dos entrevistados acredita que até pelo menos 2024 (ou ainda mais adiante) não deverá haver demanda suficiente para que esse mercado esteja aquecido.
Outra parte da pesquisa que trata de compensações de carbono é o conjunto de perguntas sobre fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) nas empresas. Relativamente nova, essa seção apresentou perguntas sobre mercados de carbono voluntários pela segunda vez (a outra foi na edição anterior).
Mais de 200 entrevistados contaram sobre quais medidas suas organizações estão adotando para tentar reduzir as emissões de forma voluntária –desses, menos de 50 disseram que a compra de compensações climáticas está entre elas.
No entanto, as opiniões sobre compensação de carbono foram, em geral, amplamente positivas. Quase 80% dos profissionais concordam com a ideia de que isso permite às empresas que não emitem Gases de Efeito Estufa (GEE) contribuir para as reduções de emissões –60% discordam de que a compensação de carbono é puro “greenwashing”.
Já a seção sobre comércio internacional de compensações de carbono (incluindo questões sobre as perspectivas para o Acordo de Paris da ONU) revela que as compras voluntárias por empresas devem ser a maior fonte de demanda por compensações de carbono nos próximos anos, à frente dos sistemas de comércio de emissões (ETSs) e da CORSIA.