Ir para conteúdo

Por que o Japão abraçou os investimentos ESG?

David Runacres
David Runacres
Head of Japan, Data & Analytics, London Stock Exchange Group

Até alguns anos atrás, parecia que o setor de serviços financeiros do Japão havia perdido o bonde do ESG. Hoje em dia, no entanto, o país asiático se tornou um dos principais entusiastas de medidas ESG e investimentos sustentáveis. Leia, a seguir, ​​o que impulsionou essa mudança.


  1. O Fundo de Investimento de Pensão do Governo (Government Pension Investment Fund ou GPIF) japonês, maior fundo de pensão individual do mundo, vem alocando recursos em investimentos ESG desde 2017.
  2. Em consequência, um número cada vez maior de empresas do país tem recorrido a pontuações ESG para exibir suas credenciais na área ambiental, social e de governança aos investidores.
  3. Após o governo japonês ter se comprometido a atingir a neutralidade de carbono até 2050, o setor financeiro foi pressionado a perseguir metas de desenvolvimento sustentável por meio de decisões de investimento.

Para mais informações baseadas em dados diretamente no seu inbox, assine o boletim semanal Refinitiv Perspectives

O Japão tem o maior fundo de pensão individual do mundo, o GPIF, com US$ 1,6 trilhão em ativos e resultado de décadas de dedicação e esforço dos trabalhadores japoneses.

Naturalmente, uma reserva de ativos desse porte é capaz de impactar os mercados em que são negociados. Além disso, o conhecido desafio demográfico japonês, de contar com uma população em franco envelhecimento, exige que o fundo tenha uma visão extremamente ampla dos investimentos, dada à necessidade de arcar com as pensões de um enorme número de idosos ao longo deste século.

As pontuações ESG da Refinitiv refletem a estrutura de dados ESG subjacente e são uma medida transparente do desempenho das empresas nessa esfera

O Fundo de Investimento de Pensão do Governo (GPIF) do Japão, maior fundo de pensão individual do globo, tem investido cada vez mais em projetos ESG

Como o GPIF começou a investir em ESG?

O GPIF deu os primeiros passos no setor de finanças sustentáveis em 2015, com a assinatura do documento “Princípios para o Investimento Responsável” (Principles for Responsible Investing, ou PRI), ao mesmo tempo em que publicava seus próprios conceitos de investimento alinhados a isso.

Foi só em 2017, no entanto, que o GPIF passou a alocar fundos em investimentos ESG. A princípio, foram destinados US$ 27 bilhões para ações com boas pontuações ESG –divididos em três índices ESG, incluindo o FTSE Blossom Japan Index.

No ano seguinte, foram realizados financiamentos de índices de baixo carbono da ordem de US$ 10 bilhões, evidenciando a adesão do fundo ao ESG como um selo de qualidade dos ativos.

O GPIF foi além: pediu a todos os gestores de ativos externos com quem trabalha no Japão para colocar o ESG como uma medida fundamental das estratégias de investimento. Em 2017, a entidade também revisou seus critérios de avaliação com pontuações significativamente mais altas para boa administração e outras práticas relacionadas a ESG.

Devido à escala de investimentos do GPIF, esse movimento chamou a atenção do mercado financeiro interno –e da Ásia como um todo. E a abordagem transparente adotada pelo GPIF ao revelar suas alocações e índices escolhidos ​​causou enorme impacto, especialmente entre as empresas japonesas domésticas, que representam a maior concentração de grandes corporações fora dos Estados Unidos.

Classificações ESG ganham novo status

Uma recente pesquisa realizada pelo GPIF com empresas japonesas listadas em bolsa mostrou que quase todas as companhias de média capitalização ou acima desse patamar estavam cientes das atividades de fundos na área ESG e dos índices que vinham sendo utilzados; algumas dessas organizações, inclusive, haviam implementado mudanças estruturais em decorrência disso.

Constatou-se ainda que grandes empresas de manufatura já recorrem a classificações ESG para medir as pontuações das cadeias de suprimentos, que costumam funcionar como um verdadeiro labirinto entre os grandes fabricantes japoneses. Isso vem sendo feito na tentativa de exibir fortes credenciais ESG para um mercado de investimento que valoriza cada vez mais esses fatores. Ou seja, em vez de ser percebido somente como uma medida da qualidade dos ativos, os princípios ESG vêm sendo adotados de forma mais ampla, para avaliar empresas e suas atividades—tendência que deve seguir forte no Japão nos próximos anos.

Neutralidade de carbono: meta governamental

O governo japonês finalmente assumiu um papel de liderança na área de sustentabilidade. Considerado até pouco atrás um bastião do conservadorismo e altamente resistente a mudanças, o primeiro-ministro Yoshihide Suga anunciou uma meta ambiciosa: alcançar a neutralidade de carbono no Japão até 2050. Esse aceno governamental, inclusive, acabou por estimular apelos domésticos para que se persiga o ousado (e provavelmente impossível!) projeto de chegar a esse resultado até 2030.

O país também anunciou as suas metas de desenvolvimento sustentável, deixando claro que as soluções na esfera energética e ambiental andam de mãos dadas com o desenvolvimento econômico.

Toda essa movimentação vem pressionando a indústria a fazer o mesmo, e recentemente, surgiram evidências disso. A Dai-Ichi Life Insurance e a Nippon Life Insurance anunciaram que não emprestarão mais dinheiro para a construção de novas usinas termelétricas a carvão. Da mesma forma, o Sumitomo Mitsui Trust Bank e o Resona Bank fizeram declarações semelhantes sobre o financiamento de tais empreendimentos.

O governo do primeiro-ministro Yoshihide Suga está assumindo um papel de liderança na meta do Japão de atingir a neutralidade de carbono até 2050

Influência no comportamento do investidor

Como vimos, bastam ações de um grande grupo de investimentos para que o efeito se propague para todo o mercado, alterando o comportamento não apenas dos investidores, mas dos órgãos governamentais e até do setor industrial.

Embora a adesão do GPIF ao ESG não tenha sido o único fator a impulsionar esse movimento, definitivamente contribuiu para criar um senso de urgência que não é muito comum no país. E não há dúvidas de que tanto o Japão quanto o resto do mundo só tem a ganhar com isso.

As pontuações ESG da Refinitiv refletem a estrutura de dados ESG subjacente e são uma medida transparente do desempenho das empresas nessa esfera