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Recuperação do dólar pode afetar retomada pós-pandemia

Saikat Chatterjee, CFA
Saikat Chatterjee, CFA
Senior FX Correspondent na Thomson Reuters

Uma pausa na forte tendência de baixa do dólar mostra sinais de se transformar em uma recuperação mais robusta, representando uma ameaça à retomada econômica pós-pandemia e aos fluxos de investimento para mercados emergentes.

O dólar vinha se enfraquecendo e caiu 4,4% apenas no último trimestre de 2020, tendência que costuma prenunciar uma recuperação econômica. Mas o rali da moeda norte-americana já se estendeu para um terceiro mês consecutivo, após a aparente relutância do Fed em reagir à alta nos yields dos Treasuries (que representa aumento nos custos de empréstimos) ou às expectativas de aumento de juros.

Apenas nas últimas duas semanas, o dólar saltou 3% em relação a uma cesta de pares

Os mercados emergentes sofrerão o maior impacto da força do dólar, à medida que ela leva a saídas consideráveis desses países, como visto no ano passado.

Nesta terça-feira, a moeda norte-americana recuava, trazendo algum alívio aos mercados. Mas sua alta, assim como o avanço de 64 pontos-base neste ano nos rendimentos dos Treasuries de dez anos, pode muito bem acelerar após a aprovação do pacote de 1,9 trilhão de dólares do governo Biden, caso os dados continuem a mostrar a economia norte-americana em ascensão.

O Goldman Sachs prevê que a economia dos EUA crescerá 7,7% neste ano e também trabalha com uma perspectiva mais otimista para o mercado de trabalho.

Normalmente, uma economia norte-americana saudável beneficia o restante do mundo. Mas a recuperação explosiva do crescimento dos EUA está permitindo ao dólar uma “vantagem de três a seis meses” sobre outras moedas, disse Aaron Hurd, gestor de portfólio que ajuda a administrar 145,3 bilhões de dólares em ativos na State Street Global Markets.

“Trata-se do ritmo diferente da recuperação econômica e do sentimento de risco macro devido ao potencial para movimentos ocasionais de aversão a risco”, disse Hurd.

Portanto, os “bears” do dólar podem ter que correr para se proteger. O termo “bear” (urso) se refere a investidores que apostam na queda do preço de um ativo e faz alusão à maneira como ursos se movimentam ao atacar, de cima para baixo.

Dados de posicionamento mostram “hedge funds” reduzindo posições vendidas em dólar para 29 bilhões de dólares na semana passada. Mas esse valor ainda está bem acima da média histórica de 9 bilhões de dólares e não muito longe dos níveis mais altos em uma década, em torno de 36 bilhões de dólares, atingidos no final de janeiro.

A valorização do dólar aperta as condições financeiras em todo o mundo, desacelerando os fluxos de capital.

O movimento desafia particularmente países de mercados emergentes, que dependem de financiamento externo. Uma análise do ano passado feita pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês) revelou que cada alta de 1% no dólar reduz 0,3 ponto percentual da taxa de crescimento esperada para os países emergentes estudados.

“Um rali do dólar junto com o aumento dos rendimentos trará um verdadeiro ‘tantrum'”, disse Salman Ahmed, chefe global de macroeconomia da Fidelity International.

No mercado financeiro, “tantrum” é um termo usado em referência a uma violenta reação de investidores a mudanças em condições de liquidez e de estímulos. O episódio mais famoso, que ficou conhecido como “taper tantrum”, é de maio de 2013, quando os yields dos Treasuries dispararam após o Fed sinalizar redução de estímulos.

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Analistas do BNY Mellon disseram que a alta do dólar recebeu “sinal verde” após a recusa do Fed em conter a alta dos rendimentos reais dos títulos.

“Enquanto esse aumento nos rendimentos reais persistir, o dólar deve continuar sob pressão de alta. Isso exigirá que a inflação implícita suba para travar a alta do dólar”, disse o BNY.

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