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Tesouro enfrenta vencimento de R$605 bi em dívida no começo de 2021

Jamie McGeever
Jamie McGeever
Senior Economics Correspondent, Brasil, Thomson Reuters

A dívida do Brasil cresceu a níveis sem precedentes devido à pandemia de Covid-19, e o governo enfrenta vencimento de 605 bilhões de reais no começo do próximo ano, com as necessidades de financiamento de abril batendo recorde para um único mês.

Em público, pelo menos, autoridades do Tesouro Nacional insistem que não haverá problema em rolar a dívida, com o colchão de liquidez podendo cobrir pelo menos três meses de financiamento.

Além disso, quase toda a dívida brasileira é denominada em reais e mais de 90% dela é detida por investidores domésticos, muitos dos quais são obrigados a detê-la sob regras bancárias.

Analistas financeiros também veem pouco risco de boicote por parte dos credores, o que provavelmente desencadearia uma grave crise e causaria estragos nos mercados financeiros brasileiros.

Mas as chances de o Tesouro ter dificuldade em rolar a dívida, devido a repentinas condições políticas, econômicas ou de mercado desfavoráveis, não são zero. E é provável que a instituição pague um prêmio por tentar postergar o vencimento de tanta dívida de uma só vez, dizem analistas.

De acordo com dados do Tesouro, cerca de 605 bilhões de reais da dívida pública mobiliária federal interna vencem nos primeiros quatro meses do próximo ano. Isso representa 14,1% do estoque de dívida interna do Brasil, de 4,82 trilhões de reais.

O mês a ser observado é abril, quando será preciso rolar 283 bilhões de reais de dívida, ou 6,6% do estoque total. É o mês com maior volume financeiro de papéis vincendos já registrado, segundo o Tesouro.

“É uma quantia grande e, se as pessoas quiserem reduzir um pouco sua exposição por qualquer motivo, torna-se uma quantia significativa”, disse Sergi Lanau, vice-economista-chefe do Instituto Internacional de Finanças (IIF, na sigls em inglês), com sede em Washington.

“Não é uma situação muito boa para se estar, mas seria muito pior se fosse a dívida externa. Não estamos muito preocupados com a concentração de vencimentos. Mas, se algo der errado naquele momento, você estará exposto”, afirmou.

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A análise do IIF mostra que a dívida interna do governo com vencimento em abril é de 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB), também um recorde para um único mês.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse não ver “nenhum problema” para o Tesouro rolar sua dívida. Cerca de metade dos 600 bilhões de reais com vencimento no início do próximo ano já pode ser coberta por recursos “automaticamente provisionados” –em referência a 200 bilhões de reais de transferências de resultados do Banco Central para o Tesouro e “100 bilhões e pouco” vindos com a desalavancagem de bancos públicos.

O déficit primário do Brasil, excluindo o pagamento de juros, deve atingir quase 12% do PIB neste ano, com a dívida geral subindo para cerca de 95% do PIB, segundo o governo.

Isso forçou o Tesouro a tomar mais empréstimos, cada vez mais via papéis de curto prazo, porque é mais barato e porque a crescente preocupação com as perspectivas fiscais significa que investidores estão relutantes em financiar o governo por prazos mais longos.

Embora a redução do prazo médio de vencimentos da dívida e as baixas taxas de juros tenham reduzido o custo médio com o serviço da dívida aos menores níveis já registrados, o chamado “risco de rolagem” para o Tesouro aumentou drasticamente.

“O problema seria se não pudéssemos vender nenhum título. Mas não devemos nos preocupar muito, há dinheiro no sistema”, disse um especialista em juros de um hedge fund em São Paulo.

“O Tesouro não ficará sem dinheiro: esse não é o problema. Mas continuará pagando taxas mais altas e terá uma curva (de juros) inclinada”, disse.

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