O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está prometendo uma revisão ambiental das políticas do governo em uma escala que se assemelha com a proposta do “Green New Deal” dos Estados Unidos, de acordo com assessores próximos do candidato ao Palácio do Planalto, documentos da campanha e do PT.
A grande questão, se ele vencer a eleição de domingo, é se Lula pode reunir vontade política para financiar tais ambições.
Com planos de conceder um novo status de proteção a meio milhão de quilômetros quadrados da floresta amazônica, combater o desmatamento, subsidiar a agricultura sustentável e fazer uma reforma tributária para inaugurar uma economia verde, Lula pode ter que escolher suas batalhas.
Como declaração de intenção, as propostas ambientais de Lula e seus assessores marcam um afastamento das políticas do presidente Jair Bolsonaro (PL), que é candidato à reeleição, e uma atualização profunda das prioridades do próprio PT nas últimas décadas.
Embora a Presidência de Lula, entre 2003 e 2010, tenha reduzido efetivamente a destruição da floresta tropical, ele abraçou o desenvolvimento industrial tradicional com pouca consideração pelas emissões de gases causadores do efeito estufa. Sob seu comando, o BNDES financiou o avanço da indústria de carne bovina na Amazônia e a Petrobras desenvolveu vastas novas reservas de petróleo.
Agora Lula e seus assessores abraçaram a transição para uma economia verde como foco de suas políticas de desenvolvimento, juntando-se a uma onda de líderes de esquerda que priorizam a política climática na região, inclusive no Chile e na Colômbia.
Como as lutas dos presidentes recém-eleitos já destacaram, no entanto, é mais fácil falar do que fazer a implementação de uma agenda tão transformadora. Nos Estados Unidos, o Green New Deal patina no Congresso e o presidente Joe Biden adaptou algumas ideias para sua própria agenda climática.
Marcio Astrini, chefe do grupo ambientalista Observatório do Clima, disse que as propostas de Lula são um projeto promissor, mas acrescentou: “Se isso vai acontecer na prática é outra coisa”.
A ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, que trabalhou nos governos Lula e Dilma Rousseff, chamou as propostas da campanha petista de “um movimento tremendo”, acrescentando: “Deus e todo mundo falando disso agora, como é que eles vão expor isso?´”.
Por outro lado, a campanha de Bolsonaro falou pouco sobre suas propostas ambientais para um segundo mandato. O presidente tem reduzido a proteção à Amazônia desde 2019, permitindo que o desmatamento subisse para uma máxima de 15 anos. A assessoria de imprensa de Bolsonaro não respondeu a pedidos de comentários.
Um representante do PL disse que não tinha como comentar o assunto.
A deputada eleita Marina Silva, também ex-ministra do Meio Ambiente de Lula, comparou os planos do petista para restaurar a forte proteção institucional da floresta tropical a um “esforço de recuperação pós-guerra” após o legado de Bolsonaro.
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Barreiras Do Congresso
Mesmo que Bolsonaro perca a reeleição, como sugerem as pesquisas, o forte desempenho de seus atuais aliados na eleição para o Congresso pode causar problemas para a agenda de Lula, uma vez que partidos ligados a Bolsonaro fizeram as maiores bancadas no Senado e na Câmara dos Deputados.
A influência dos parlamentares sobre o apertado Orçamento pode tornar difícil para Lula cumprir até mesmo sua proposta mais básica: intensificar a aplicação da lei ambiental para combater o desmatamento na Amazônia.
Lula prometeu mais capital humano e financiamento para o Ibama e o ICMBio, mas ambos dependem do processo orçamentário do Congresso.
Ele pode ter mais liberdade com decretos para abordar cerca de 570.000 quilômetros quadrados de “território não designado” na Amazônia, que pertence ao governo federal, mas não foi reservado para nenhum uso principal. Essas áreas são especialmente vulneráveis a madeireiros criminosos, mineradores e grileiros.
Um governo Lula procuraria estabelecer essas terras como reservas indígenas ou unidades de convervação, segundo Marina Silva.
Embora essa designação formal possa provocar maiores consequências para o desmatamento ilegal, a fiscalização ainda exigiria novos recursos do orçamento federal.
O Congresso também seria fundamental para os planos do PT de reformar o sistema tributário, impondo taxas mais altas para indústrias poluentes e taxas mais baixas para atividades “verdes”, como agricultura sustentável ou carros elétricos.
O deputado petista Nilto Tatto (SP) disse que Lula pretende obter amplo apoio de parlamentares da poderosa Frente Parlamentar da Agropecuária, que representa cerca de metade do Congresso.
Embora a maioria dos líderes do agronegócio tenha se alinhado com Bolsonaro, Tatto disse acreditar que os agricultores estão ficando mais sintonizados com as consequências das mudanças climáticas, à medida que o clima extremo prejudica as plantações.
Um plano do governo Lula de oferecer empréstimos agrícolas “verdes” subsidiados para plantar em pastagens já abertas, uma tentativa de reduzir o desmatamento, também pode ajudar a conquistar o lobby agrícola.
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Ajuda Externa
Lula também pode ter mais facilidade em conquistar aliados internacionais, já que vários líderes europeus sinalizaram uma vontade de colaborar na preservação renovada da Amazônia.
“Se o mundo estiver disposto a ajudar, a manter uma árvore em pé na Amazônia pode valer mais do que qualquer outro investimento”, disse Lula a repórteres em agosto.
Tatto e outros assessores disseram que Lula quase certamente agirá rapidamente para reiniciar o Fundo Amazônia, que usou contribuições da Noruega e da Alemanha para esforços de preservação até que o governo Bolsonaro interrompeu as atividades em 2019, citando irregularidades não especificadas.
Lula também está buscando uma aliança com outros países que possuam florestas tropicais, como Indonésia e República Democrática do Congo, para pressionar os países ricos a financiar a preservação das florestas. O ex-chanceler Celso Amorim propôs uma cúpula regional sobre a Amazônia no próximo ano.
O Brasil em geral estará mais engajado na diplomacia climática internacional, disse Tatto, e pode até criar uma posição de czar climático semelhante à do enviado climático dos EUA, John Kerry.