Metais como cobre e níquel têm um importante papel na jornada global rumo ao Net Zero. Por isso, neste post, exploramos a situação em que se encontram esses mercados e os fatores que afetam sua oferta e demanda.
- No mercado de cobre, há a preocupação de que em breve não haverá oferta suficiente para atender ao aumento da demanda. Esse déficit pode prejudicar as metas de sustentabilidade da COP, devido ao papel crucial do metal em nosso caminho para zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa, o chamado Net Zero.
- Segundo análises da Refinitiv, nos próximos dois a três anos, o mercado de níquel terá um grande superávit. Consequentemente, essa demanda mais fraca, aliada ao aumento da oferta, tornará os preços do níquel mais vulneráveis do que os do cobre. E qualquer volatilidade de mercado resultante disso pode ser uma má notícia para a energia sustentável, sobretudo em áreas como a energia solar, onde o níquel desempenha um papel crucial na produção de painéis.
- Em todo o mundo, os governos estão assumindo um papel mais ativo no mercado de metais.
Em nosso percurso até o Net Zero, tem sido bastante ressaltada a necessidade global de cobalto e lítio. No entanto, também devemos prestar atenção ao que está acontecendo com metais básicos como o cobre.
É provável que falte cobre
O cobre é certamente tão vital para que possamos zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa quanto metais que vêm ganhando mais destaque, como o cobalto e lítio. Para ter uma ideia de sua importância na jornada rumo ao Net Zero, os veículos elétricos à bateria contêm quatro vezes mais cobre do que um carro com motor de combustão interna.
O que até agora não está claro, contudo, é de onde virá esse material.
Atualmente, o cobre parece ter se restabelecido acima de US$ 8.000/t, tendo permanecido abaixo deste patamar durante grande parte do quarto trimestre de 2022. Os estoques da London Metal Exchange (LME) encontram-se em níveis mínimos históricos, e a Codelco, maior produtora de cobre do mundo, está oferecendo um prêmio recorde de US$ 235/t para a Europa em 2023.
Por enquanto, parece que as preocupações com a economia mundial foram superadas por problemas de abastecimento decorrentes da escassez de água no Chile e teores de minério mais baixos nos principais países mineradores, percalços que provavelmente farão com que o aumento da produção nas minas neste ano não chegue a 2%.
Mas a atual dinâmica do mercado mascara uma tendência mais preocupante, e que já está evidente há algum tempo, de que simplesmente para acompanhar a demanda precisamos de mais oferta. Ou seja, precisávamos de um grande número de novos projetos em desenvolvimento –e isso não aconteceu.
E, a menos que isso mude, os analistas estimam que a lacuna na oferta pode chegar a vários milhões de toneladas até meados da próxima década. Segundo os nossos estudos, o fornecimento global de cobre deverá diminuir a partir de 2025 e ficar assim até pelo menos o final desta década.
Como o prazo necessário para colocar uma grande mina de cobre em operação é de dez a doze anos, precisamos de novos projetos agora. E, para enfrentar essa perspectiva de sério déficit no fornecimento da commodity, o setor precisará superar sua resistência em investir.
O problema é que o recente período de preços mais baixos só atrapalhou os investimentos, e isso sem falar em outros fatores igualmente prejudiciais, como dividendos mais altos para os acionistas; recursos menos acessíveis; impostos mais altos; maior grau de impurezas; e o fim dos depósitos minerais de fácil exploração.
Na Refinitiv, acompanhamos os custos das minas ao redor do globo por meio de nosso aplicativo METCOST, que nos mostrou um salto nos custos no primeiro trimestre de 2022 e agora indica que novos investimentos só deverão ser retomados após a cotação do cobre atingir os US$ 8.500/t.

Mercado de níquel deverá ter superávit considerável
A situação dos mercados de níquel é completamente diferente do cobre. O “metal do diabo”, como às vezes é chamado, ganhou as manchetes em 2022 quando os preços quadruplicaram na LME (para mais de US$ 100.000/t) e, como consequência, o pregão teve de ser suspenso e as operações, canceladas. Essa alta da cotação, entretanto, teve pouco a ver com déficits estruturais, e sim com um short squeeze e falta do metal para entrega imediata na LME.
De acordo com o International Nickel Study Group, a previsão atual de demanda global para a commodity é de 4,2%, queda drástica em relação aos 8,6% que a entidade havia calculado em maio de 2022, e reflexo da tendência de menor consumo de aço inoxidável no mundo.
A longo prazo, mesmo com a demanda por baterias aumentando sua participação no mercado de 4% em 2018 para os atuais 7% –e potencialmente para 25% em 2030—, nossos analistas não preveem problemas de escassez. Pelo contrário, nos próximos dois a três anos, a Refinitiv estima que o mercado de níquel terá um excedente considerável, já que a produção, impulsionada principalmente pelo crescimento na Indonésia, continua a superar o que, no entanto, ainda é uma demanda razoavelmente robusta.
É importante lembrar que as preocupações com a capacidade da indústria de níquel de atender à demanda global não se tornaram realidade. Afinal, quando a escassez de oferta levou os preços a US$ 50.000/t no início dos anos 2000, a China encontrou uma alternativa na forma de níquel pig iron (NPI), processado a partir de minério laterítico de baixo teor da Indonésia e das Filipinas. E, quando a Indonésia proibiu as exportações do minério em 2014, os produtores das Filipinas aumentaram os seus envios para preencher a lacuna. Desta vez, a produção de mate de níquel de NPI para produzir sulfato parece ser parte da solução para a manufatura de baterias.
Também vale dizer que com o aumento da produção de níquel na Indonésia –que em 2023 e 2024 deve gerar superávits maiores do que o previsto em relação ao tamanho do mercado—, os preços, em um ambiente de demanda mais fraca, parecem apresentar maior vulnerabilidade do que os do cobre.

Consequências da instabilidade dos mercados
É preciso ressaltar que os recentes sobressaltos na negociação de níquel na LME desestabilizou o mercado, e as consequências serão de longo alcance.
Vale a pena traçar um paralelo com a última grande crise do cobre: o escândalo de Hamanaka na década de 1990. Esse evento levou os reguladores a pressionarem Alan Whiting, Tesouro do Reino Unido, e à adoção da Lending Guidance (agora conhecida como Lending Rules), que procurava evitar long squeezes. Inclusive, como em 2022 o que causou a subida do preço do níquel foi um short squeeze, devemos considerar se as regras não precisariam ser atualizadas.
Enquanto isso, vemos que os volumes de negociação na cotação de referência de três meses despencaram em cerca de um terço, e crescem as dúvidas sobre a adequação do preço da LME como referência de mercado.
Não é inconcebível que, pelo menos em relação ao níquel, o mercado volte a ter um preço determinado pelo comércio físico e não pela LME. Embora os metais possam ser o nosso futuro, ironicamente, não é apenas na forma de precificação que talvez precisemos voltar ao passado para nos orientarmos melhor.
Que papel os governos desempenharão no mercado de metais?
Uma coisa é certa: os governos deverão ter um papel muito maior nos mercados de metais.
A nacionalização desses recursos naturais será fundamental. O Canadá, por exemplo, proibiu, em novembro de 2022, o investimento chinês em três empresas que buscam desenvolver a produção de lítio. Paralelamente, os governos deverão começar a subsidiar novos projetos dentro de suas próprias fronteiras para garantir suas matérias-primas.
Sabemos que não é de hoje que países como a China têm negócios na África para assegurar sua parte na extração de cobalto, mas até mesmo o governo do Reino Unido está indo nessa direção (embora de maneira um tanto indiferente), como vimos na saga Britishvolt.
Acreditamos ainda que haverá mais regulamentação em relação à reciclagem, o que afetará o fluxo global de sucata, com uma menor quantidade indo parar na China e maior processamento desse material no Ocidente.
Aliás, já estamos vendo isso acontecer. Após uma série de fechamentos de usinas secundárias na década de 1990 e início dos anos 2000, os EUA estão aumentando sua capacidade de produção de cobre secundário novamente, com o Wieland Group prometendo a inauguração de uma nova usina de reciclagem em Kentucky já neste ano. A empresa também tem planos para a instalação de uma usina secundária na Alemanha em 2025.
À medida que as empresas competem para obter esses recursos naturais escassos, deveremos ver mais integração vertical. As tentativas de Elon Musk de adquirir uma participação na Glencore para garantir o seu fornecimento de matéria-prima lembram os primeiros dias da indústria automotiva nos EUA, com a Ford e sua siderúrgica Rouge River em Dearborn, Michigan.
Reestruturação societária em alta
Devemos também ficar atentos a outros tipos de reestruturações societárias que remetam a épocas passadas.
Na década de 1970, as empresas de petróleo e gás entraram com tudo na mineração, mas no início dos anos 2000 todas as grandes companhias já haviam alienado suas participações, com a Exxon sendo a última delas, desfazendo-se de sua parte na mineradora chilena Disputada apenas em 2002.
Em outubro passado, os sauditas anunciaram seus planos de investir mais em mineração, enquanto a Shell, que já foi dona da Billiton, agora tem uma rede de estações de recarga para carros movidos a bateria.
Ou seja, governos e empresas privadas estão apostando que os metais são o novo petróleo. Porém, como o cobre nos mostra, os preços altos não apenas vieram para ficar, mas são necessários para garantir que haja oferta suficiente para todas essa nova demanda à vista.
Encontrar um equilíbrio para essa desafiadora equação –que requer que os preços sejam mais baixos a fim de incentivar o uso dos metais, e ao mesmo tempo mais altos para permitir investimentos— é o que vai provavelmente determinar a velocidade e o sucesso de nossa caminhada rumo ao Net Zero.