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Inversão acentuada da curva de rendimentos do Tesouro dos EUA pode acelerar recessão

Jamie McGeever
Jamie McGeever
Senior Economics Correspondent, Brasil, Thomson Reuters

O colunista da Reuters Jamie McGeever analisa as potenciais consequências econômicas da inversão da curva de rendimentos do Tesouro dos EUA.


  1. A inversão da curva de juros do Tesouro dos EUA quase sempre anuncia uma recessão. A questão, no entanto, é que a enorme lacuna entre os altos custos de financiamento de curto prazo e a queda das taxas de empréstimo de longo prazo pode precipitar a desaceleração econômica que já se encontra no radar.
  2. Do ponto de vista do setor bancário, essa curva invertida, combinada com inflação de quase 9% e regulamentação pós-2008, é motivo de preocupação.
  3. Embora os bancos estejam em “boa forma”, a curva descendente irá corroer as margens líquidas de juros e restringir empréstimos, enquanto a queda das ações e títulos vista neste ano exigirá que eles desviem mais dinheiro para reparar buffers de capital que foram destruídos.

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As opiniões aqui expressas são exclusivamente do autor, colunista da Reuters.

Não há dúvidas de que se os bancos reduzirem crédito às empresas e às famílias haverá um impacto econômico negativo.

Essas instituições financeiras podem ganhar dinheiro quando as taxas de juros sobem, mas isso é muito mais fácil quando a curva de rendimentos do Tesouro se inclina para cima, permitindo aos bancos obter dinheiro barato para emprestar aos clientes por um valor mais alto. Já uma curva significativamente invertida prejudica a expansão da margem.

“A inclinação da curva é importante”, diz Christopher Wolfe, diretor administrativo do departamento de bancos norte-americanos na Fitch Ratings, em Nova York.

Wolfe observa que o crescimento dos empréstimos bancários acelerou e que as margens líquidas de juros expandiram no segundo trimestre devido ao contínuo aperto do Fed. No entanto, apesar de a curva de rendimentos ter sido comprimida e brevemente invertida entre abril e junho, ela ainda era predominantemente positiva.

Só que isso mudou.

Duzentos e vinte e cinco pontos-base de aumento de juros no ano, e a promessa de novas altas adiante (à medida que o Fed se esforça para trazer a inflação para perto da meta oficial, de 2%) jogou o rendimento de dois anos quase 50 bps acima do rendimento de 10 anos.

Esta é a inversão mais profunda desde 2000, embora já tenha recuado para 40 bps na quarta-feira passada (17 de agosto), com a divulgação de dados de inflação mais brandos do que o esperado para julho.

De acordo com analistas do Bank of America, se a “taxa terminal” do Fed for superior a 4% –ou seja, cerca de 50 bps acima do que os preços atuais do mercado sugerem–, a curva de juros pode se inverter em até 85 bps.

Essa seria a inversão mais profunda desde a recessão desencadeada por Volcker em 1981.

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Recessão agora?

Atualmente, já se discute se a economia norte-americana se encontra ou não em recessão. Em termos reais, a produção do PIB encolheu no primeiro e segundo trimestres deste ano, o que, tecnicamente, se enquadra na definição de recessão.

Mas o fato de muitos economistas preverem um forte crescimento nominal, e de o mercado de trabalho estar aquecido –com o crescimento médio do emprego em 2022 chegando a quase 500.000 por mês– tem feito com que o National Bureau of Economic Research evite chamar o atual momento de recessão total.

Os bancos, contudo, já estão começando a dar sinais de alarme. A última pesquisa do Fed com funcionários sênior da área de empréstimos demonstra que, em julho, 24% dos bancos já endureceram as condições de empréstimos para os setores do comércio e da indústria. Entre os bancos de grande porte, esse índice foi ainda maior, 26,5%.

A pesquisa do Fed mostrou que os bancos estão fazendo isso cobrando prêmios mais altos em empréstimos, ampliando os spreads de empréstimos ou mesmo endurecendo as condições das garantias. À medida que o banco central dos EUA segue com o aperto monetário, o mesmo acontece com as condições de empréstimo oferecidas pelas instituições financeiras.

No segundo semestre, conforme os bancos reservavam mais dinheiro para cobrir possíveis perdas com empréstimos, seus lucros caíram. As provisões chegaram a quase US$ 10 bilhões no período e, de acordo com Christopher Whalen, da Whalen Global Advisors, retornarão a aproximadamente US$ 20 bilhões por trimestre antes que se dê o que pode ser chamado de “acerto de crédito”.

Vale lembrar que durante as duas últimas recessões (2007 a 2009 e 2020) as provisões de empréstimos dos bancos chegaram a US$ 60 bilhões por trimestre.

Além disso, o forte aumento das taxas de juros neste ano fez com que essas instituições tivessem que baixar o valor dos títulos de renda fixa em suas carteiras, algo particularmente traumático para o setor.

Betsy Graseck, do Morgan Stanley, estima que apenas os três maiores bancos dos EUA –JP Morgan, Bank of America e Citi– podem precisar reduzir seus ativos ponderados pelo risco em mais de US$ 150 bilhões até o final deste ano.

Bem, esse é outro problema que deverá persistir enquanto a curva de juros estiver profundamente invertida, os mercados forem frágeis e a recessão pairar sobre a economia.

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