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Perspectivas para os mercados de ações em 2022

Mike Dolan
Mike Dolan
Reuters Editor-at-Large for Finance & Markets

Mike Dolan, editor geral de finanças e mercados da Reuters News, adverte que neste ano nem tudo deve ser um mar de rosas para os mercados acionários. Neste post, ele analisa por que fatores negativos como inflação, aumento do número de casos de Covid-19 ao redor do globo e questões geopolíticas podem prejudicar o desempenho das ações.


  1. A penúltima pesquisa de 2021 do Bank of America com gestores de fundos apontou a maior superexposição a ações nos EUA em oito anos. Ao mesmo tempo, enquetes semanais com clientes do JPMorgan mostram que 60% dos gestores planejam aumentar ainda mais o nível de exposição a esses ativos.
  2. O principal argumento a favor dos mercados acionários é baseado no sentimento de que os índices de ações se mostraram resistentes à desaceleração econômica provocada pela pandemia.
  3. No entanto, a previsão do Morgan Stanley é que em 2022 haja um declínio de 6% em relação aos níveis atuais, já que os auxílios governamentais estão sendo gradualmente removidos na esteira da recuperação econômica do “pós-pandemia”.

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Hoje em dia, eu diria que é preciso ler e reler atentamente as linhas finas dos contratos financeiros para lembrar que os mercados de ações podem voltar a despencar algum dia. Isso porque as frequentes cláusulas de isenção de responsabilidade para os casos de eles caírem parecem ser amplamente ignoradas pelos investidores. E, após três anos de ganhos consecutivos, os administradores de fundos estão claramente apostando que esse é o novo normal.

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Altos níveis de exposição ao mercado de ações

A penúltima pesquisa mensal de 2021 com gerentes de fundos do Bank of America mostrou a maior superexposição a ações nos EUA em oito anos, com apenas 8% dos 388 entrevistados gerenciando mais de US$ 1 trilhão em ativos.

Ao mesmo tempo, uma sondagem semanal com clientes do JPMorgan indicava que 60% dos gestores planejavam aumentar ainda mais essa exposição nos dias e semanas seguintes.

Assista o vídeo: “Is a Stock Market Melt-Up on the Cards?” | The Big Conversation | Refinitiv

À medida que recebemos as previsões de investimentos para 2022 elaboradas por diversos bancos e fundos, os argumentos em prol das ações têm se mostrado bastante simples.

A ideia básica é que se uma pandemia global e a maior contração econômica vista em uma geração não fez com que os índices acionários operassem em território negativo, o que poderia acontecer de agora em diante?!

Assim, o consenso é que deveríamos continuar surfando a onda de liquidez até que ela finalmente se dissipe.

Mesmo com os bancos centrais encerrando seus pacotes emergenciais de estímulo econômico e com a inflação de volta ao radar, os últimos ativos recomendados para o momento são títulos –a menos que se aposte em uma nova contração da economia em um ano.

Mas poucos acreditam nisso.

Também é difícil argumentar com o fato de que as ações nem sempre caem ao longo de todo o ano. Para se ter uma ideia, desde 1960 o S&P 500 só fechou no vermelho em um de cada quatro anos.

O que o MSCI All-Country Stock Index demonstra?

De acordo com o índice MSCI’s All-Country Stock, as ações tiveram os melhores três anos desde a bolha da internet, duas décadas atrás –e nesses mais de vinte anos houve apenas quatro anos em que elas fecharam com resultado negativo.

Isso sem falar que o nível do MSCI’s All-Country Stock dobrou desde a profunda, mas breve, depressão deflagrada pela pandemia em março de 2020.

Além do famoso boom da virada do milênio, nenhum outro período de três anos foi mais produtivo para os mercados acionários nos 34 anos de história desse índice global.

Diante dessas métricas, do consenso absoluto e da aparente falta de alternativas, é óbvio que parei para prestar atenção quando uma das instituições mais otimistas de Wall Street previu que haveria queda nos mercados de ações em 2022.

O S&P 500 vai cair em 2022?

Nesta semana, o Morgan Stanley –um dos bancos mais assertivos em traçar uma recuperação em forma de V para os mercados financeiros após 2020— divulgou que o S&P 500 deverá cair 6% em relação aos níveis atuais até o final deste ano.

Isso não significa que devemos largar tudo e fugir para as montanhas, mas qualquer sinal negativo nas perspectivas do mercado de ações é digno de nota nestes dias, e apenas o colapso bancário de 2008 gerou um ano mais negativo para o S&P 500 desde o estouro da bolha da internet.

Removendo os estabilizadores

O raciocínio do Morgan Stanley está longe de ser alarmista. Em vez disso, a instituição fez questão de enfatizar uma “normalização” do crescimento e dos preços dos ativos.

Os seus analistas comparam o fim dos pacotes governamentais para estímulo econômico às rodinhas laterais que colocamos nas bicicletas das crianças até que elas se virem por conta própria. Ou seja, com o fim gradual da pandemia e sem a consequente ajuda dos BCs, os ativos financeiros precisariam dar um jeito de se equilibrar por conta própria. “Os mercados estão enfrentando muitos problemas ‘normais’ de meio de ciclo, como o crescimento colidindo com inflação mais alta e alterações em suas políticas”, explica o relatório do Morgan Stanley.

E, com crédito mais restrito e piores condições financeiras, a expectativa é de que os rendimentos do Tesouro de 10 anos encerrem 2022 em 2,10% (ante 1,6%) –basicamente, de volta ao nível de meados de 2019.

No entanto, mesmo essas previsões relativamente anódinas são discrepantes.

A incerteza generalizada abalará os mercados de ações?

Na contramão da previsão do Morgan Stanley, o Goldman Sachs antevê um crescimento de 9% no S&P 500 durante o próximo ano, o UBS, de 6%, e o JPMorgan, também de 6%, mas até a metade de 2022.

Claro, muito disso é apenas uma questão de timing, de quando o vento vai mudar na política, misturado com variáveis ​​macroeconômicas ainda desconhecidas que podem influenciar a inflação e até a situação da própria pandemia.

Olivier Marciot, gestor de portfólio da Unigestion, destaca que está cauteloso em relação a este ano, mas mantém a exposição a ativos de risco enquanto observa o desdobramento da política do banco central. “A história tem demonstrado que tentar antecipar as mudanças das condições financeiras de uma situação acomodatícia para uma situação de aperto geralmente produz resultados decepcionantes”, diz ele.

Além do mais, as previsões atuais partem de onde estávamos em novembro. E muita coisa pode acontecer nos mercados na virada do ano, quando não há liquidez e com investidores ansiosos por lucros bancários.

O dólar já está subindo de forma acentuada devido a uma mistura de inflação e de preocupações com taxas de juros, mas também na esteira da geopolítica que envolve aliados ocidentais, Rússia e China. E um dólar em alta, por si só, faz com que as condições financeiras mundiais se tornem muito mais “apertadas”.

Como se isso não bastasse, focos de crises militares ou choques de preços de energia relacionados a apagões na Europa podem tornar este começo de ano ainda mais tenso do que o esperado.

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* O autor deste é editor geral de finanças e mercados da Reuters News. Quaisquer opiniões expressas aqui são de sua autoria