Dando sequência à mais nova série de webinars da Refinitiv, o episódio “O Brasil no World-Check: Improbidade Administrativa”, joga luz sobre um problema que, apesar de tão próximo de corporações estatais e privadas no país, ainda desperta muitas dúvidas entre os times de risco e compliance das empresas. Veja aqui os principais pontos abordados em nosso evento online.
- A lei brasileira sobre improbidade administrativa contempla desde funcionários públicos, independentemente do escalão, até indivíduos e entidades que estejam a serviço da administração pública.
- Os três diferentes tipos de improbidade administrativa no Brasil são enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação dos princípios da administração pública.
- Apesar de ser considerada uma infração de natureza civil, a improbidade administrativa pode resultar em ações tanto na esfera civil quanto na criminal.
Recém saídos de uma longa e tempestuosa temporada de campanha eleitoral no país, a nossa memória ainda está fresca sobre um assunto que esteve bastante presente na mídia, em geral, e nas peças de propaganda televisiva nestes últimos tempos: improbidade administrativa. Apesar do termo pomposo, trata-se de algo bem fácil de compreender –e, infelizmente, existente em nossa sociedade desde a época em que o Brasil não passava de uma colônia—, pois, nada mais é do que “uma conduta inadequada, praticada por algum agente público ou por outros indivíduos com ele envolvidos, que cause danos à administração pública”, como descreve a Lei de Improbidade Administrativa (8.429/1992).
O problema é que quando falamos de agentes públicos, a primeira coisa que nos vem à cabeça são políticos (mesmo porque eles se encontram em constante evidência na mídia), e isso acaba levando muitos empresários e profissionais de compliance a classificar o risco de se relacionar com um deles como algo longínquo, improvável até. Contudo, a lei brasileira sobre improbidade administrativa contempla desde funcionários públicos, independentemente do escalão, até indivíduos e entidades que estejam a serviço da administração pública. “Por agente público, entende-se que é alguém que está a serviço da máquina pública. Pode ser um funcionário público ou mesmo uma pessoa em sua capacidade privada, seja ela física ou jurídica”, explica Humberto Aleixo, analista do Word-Check que esteve à frente de nosso mais recente webinar sobre risco e compliance, “O Brasil no World-Check: Improbidade Administrativa”.
Como se vê, o risco de uma organização privada se envolver com um caso desses é bem maior do que se pode imaginar. Por isso, o World-Check, nossa plataforma global de controle de risco (presente em mais de 245 países), se dedica a um constante e profundo trabalho de classificação de indivíduos e entidades que tenham cometido esse tipo de infração –além de, claro, todos os outros tipos de crimes financeiros já mencionados em outros posts deste blog. Com um time de mais de 400 especialistas espalhados por todos os continentes, e uma equipe dedicada exclusivamente ao Brasil, o World-Check ajuda a simplificar processos de due diligence de clientes e fornecedores, entre outros, permitindo com que as organizações cumpram com tranquilidade as regulamentações que visam combater principalmente crimes de natureza financeira, como a improbidade administrativa.
Para acessar o webinar na íntegra, clique aqui.
Três tipos diferentes de improbidade
Para entender melhor os riscos de se envolver, direta ou indiretamente, com essa prática, é preciso irmos mais a fundo em suas características. Vamos começar pelas três diferentes classificações da improbidade administrativa no Brasil: enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação dos princípios da administração pública.
Enriquecimento ilícito
Em relação ao enriquecimento ilícito, o artigo 9 da Lei de Improbidade Administrativa é bem claro. “Constitui ato de improbidade administrativa, importando em enriquecimento ilícito, auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade…” Ou seja, para ser considerado crime, é preciso que haja a intenção de se cometer a infração, que se tenha plena consciência dos fatos referentes a qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo.
Como conta Humberto Aleixo, os casos mais típicos são os de irregularidades em processos de licitação pública para favorecer determinadas empresas pertencentes a familiares. “Esses processos de licitação irregulares costumam gerar enriquecimento ilícito para o agente público e/ou para os associados”, explica ele.
Outro exemplo comum é o aumento de patrimônio de maneira ilegítima, com recursos adquiridos de forma ilegal. Os analistas do World-Check chamam a atenção para episódios em que o patrimônio de indivíduos em cargos públicos se multiplica de forma inexplicável, e que acabam sendo relacionados à lavagem de dinheiro. “Até a utilização de equipamentos ou materiais públicos para obras particulares entram nessa primeira categoria. Vimos recentemente um secretário municipal ser preso por usar um trator da prefeitura para fins pessoais”, conta Aleixo.
Dano ao erário
Outra característica bem comum da improbidade administrativa é o chamado dano ao erário, que implica em qualquer ato que cause prejuízo direto aos cofres ou patrimônio públicos. “Vale ressaltar que a ausência de prejuízo econômico aos cofres públicos pode não configurar dano ao erário, mas não impede que a infração seja classificada como improbidade administrativa por enriquecimento ilícito”, ressalta o analista. Vemos, assim, que apesar da subdivisão em três tipos diferentes, eles quase sempre se sobrepõem uns aos outros.
Violação dos princípios da administração pública
Essa violação ocorre quando um agente público desrespeita os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência –mas, mais uma vez, devemos lembrar que para ser considerado crime é preciso que haja a clara intenção de agir dessa forma. Vale ainda dizer que essa lei se aplica, igualmente, a todas as esferas do poder público, sejam elas municipal, estadual ou federal .
Crime e castigo
Com a regulamentação da Lei de Improbidade Adminstrativa, ainda em 1992, o recado era que, como qualquer outro cidadão, os agentes públicos também deveriam ter condutas estritamente dentro da lei, atuando de maneira ética, transparente e, obviamente, de acordo com os interesses da sociedade, não em benefício próprio. E, apesar de ser considerada uma infração de natureza civil, a improbidade administrativa pode resultar em ações tanto na esfera civil quanto na criminal. “Por exemplo, se houver alguma irregularidade na condução de um processo licitatório, além de uma ação por improbidade administrativa, o acusado também pode sofrer em paralelo um processo criminal”, explica Humberto Aleixo. “Isso geralmente ocorre quando o Ministério Público lança, a princípio, uma ação civil, mas no decorrer do processo surgem outras provas que levem à revisão do pedido original”.
É importante frisar que caso o réu seja condenado na ação civil, ele vai receber sanções civis, como perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, obrigação de ressarcir os danos ao erário e pagamento de multas previstas na lei. Já no caso de uma condenação criminal, a pena pode ser de vários anos de detenção (além de multa), conforme os crimes praticados.
Mudanças recentes na lei
Como a Lei de Improbidade Administrativa está completando trinta anos, e sabemos que muita coisa mudou de lá para cá, foram necessários alguns ajustes para que ela pudesse refletir melhor a sociedade contemporânea. Assim, no ano passado, tivemos a aprovação de algumas emendas na lei. A principal mudança foi que, para que seja configurada como improbidade administrativa, seria preciso haver dolo, ou seja, ter a intenção de cometer a infração.
“Isso quer dizer que não são considerados improbidade os casos de negligência, imprudência ou mesmo imperícia”, comenta o analista do World-Check.
Outras alterações que valem a pena mencionar são a extensão do período de suspensão dos direitos políticos para até quatorze anos e a possibilidade de se estabelecer acordos de não persecução civil, que, basicamente, consiste –mediante aceitação de condições específicas— na aplicação de sanções que visam impedir o início de ação judicial. “Sabemos que casos judiciais tendem a ser morosos e, se for possível entrar num acordo para evitar o início de uma ação judicial, a sociedade só tem a ganhar, pois o dano ao erário pode ser reparado de maneira muito mais ágil”, diz Aleixo.