Nesta publicação, exploramos a atual situação da Revisão Fundamental da Carteira de Negociação –nova regulação do setor financeiro que deve entrar em vigor até janeiro de 2023— e a importância de dados estratégicos para o seu compliance.
- O Comitê de Supervisão Bancária de Basiléia (BCBS) está usando a Revisão Fundamental da Carteira de Negociação (FRTB, na sigla em inglês) para tornar mais rígidas as regras que definem como os bancos medem sua exposição ao risco de mercado.
- A transição da LIBOR (London Interbank Offered Rate) e a pandemia de Covid-19 podem complicar ainda mais a introdução dessa regulamentação.
- As regras da FRTB foram finalizadas em janeiro de 2019. No entanto, algumas jurisdições ainda têm muito trabalho a fazer para finalizar os detalhes técnicos.
Entre as inúmeras regulamentações que as instituições financeiras enfrentam, poucas terão impacto tão grande quanto a Revisão Fundamental da Carteira de Negociação (FRTB, na sigla em inglês).
O Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia (BCBS) está endurecendo as regras sobre como os bancos medem sua exposição ao risco de mercado, o que pode resultar em requisitos de capital mais elevados para essas organizações.
Uma breve recapitulação das regras de risco de mercado
Agora, além de adotar a abordagem padronizada do órgão regulador, os bancos têm a opção de projetar seus próprios modelos para calcular sua exposição ao risco de mercado.
A nova regulamentação torna as regras de risco de mercado bem mais rígidas. Isso porque ela refina o que está no escopo da carteira de negociação, estabelecendo requisitos mais severos para a qualidade dos dados e determinando cálculos para as instituições que buscam usar seus próprios modelos. Além disso, ela altera os próprios cálculos de capital para que esses levem em conta o risco de cauda e os horizontes de liquidez variáveis.
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Desafios para toda a indústria
Os bancos que buscam usar seus próprios modelos, seguindo a chamada abordagem de modelos internos (Internal Models Approach, ou IMA), precisarão realizar um novo teste de liquidez para demonstrar atividade de negociação suficiente associada aos dados dessa referência.
Conforme as instituições financeiras tentam passar nesse novo teste de liquidez, elas enfrentarão quatro principais desafios:
- Muitos mercados carecem de transparência suficiente para identificar negociações executadas utilizáveis e cotações comprometidas. Embora iniciativas como a MiFID II possam ajudar, ainda há muito trabalho a ser feito para coletar todos esses dados.
- Um grande número de negociações e cotações comprometidas precisa ser analisado para inclusão neste teste. Portanto, são necessárias ferramentas sofisticadas (muitas vezes baseadas na nuvem) que armazenem, processem e analisem gigantescos conjuntos de dados.
- Os dados precisam ser consolidados em um modelo de dados padronizado para permitir a agregação com base nos atributos do instrumento. Isso requer regras de mapeamento complexas para alinhar modelos de dados inconsistentes em muitas fontes e produtos. Por exemplo, diferentes taxonomias ou convenções de nomenclatura podem ser usadas em classes ou fontes de ativos distintas –e mesmo algo tão básico como a data de uma transação pode ser problemático, já que 17h em Nova York são 7h do dia seguinte em Tóquio.
- Os usuários precisam ser capazes de avaliar rapidamente os benefícios de adicionar fontes diferentes e refinar suas regras de mapeamento.
Provavelmente, muitos bancos usarão dados internos como sua fonte primária para esse teste de liquidez, mas isso não será suficiente para passar pelo desafio. Essas instituições precisarão recorrer a fornecedores para obter dados adicionais, que além de históricos, sejam abrangentes.
Sincronizar dados de fontes internas aos do fornecedor pode ser um tanto quanto desafiador. Porém, trabalhar com um provedor confiável pode facilitar bastante a empreitada.
Incertezas do mercado
A FRTB está sendo implementada em um cenário de mudança estrutural, que vem sendo impulsionado pela transição da LIBOR (London Interbank Offered Rate) e, sobretudo, pela volatilidade dos mercados financeiros em função das crises sanitária e econômica.
A extinção da LIBOR, programada para o final deste ano, será responsável por uma profunda transformação na liquidez do mercado. Isso acontecerá à medida que as empresas substituírem os derivativos referenciados em LIBOR por taxas alternativas livres de risco –as Risk Free Rates, ou RFRs–, como SONIA, SOFR e € STR.
Conforme o mundo dos negócios começar a se distanciar da LIBOR, observaremos mais fatores de risco não modeláveis. Embora, em última análise, isso deva começar a ocorrer com os derivativos que fazem referência a taxas livres de risco, há dois desafios.
Em primeiro lugar, durante o período de transição, a liquidez é bifurcada, o que poderá resultar em fatores de risco tanto para a LIBOR quanto para as taxas livres de risco com atividade de negociação insuficiente para passar no teste.
Além disso, como o teste é realizado ao longo de um período de doze meses, há um atraso entre a obtenção de liquidez e a aprovação de um fator de risco. Se a transição da LIBOR ocorrer rapidamente e for concluída até o final do ano, isso não deve ser um grande problema, já que a liquidez nas taxas livres de risco estará bem estabelecida antes que a FRTB entre em vigor. No entanto, pode haver uma preocupação maior nos Estados Unidos se esse processo se arrastar até 2023.
A correção do mercado que ocorreu em março do ano passado, bem no início da pandemia, foi um verdadeiro teste para a nova avaliação de liquidez da FRTB. Muitas instituições temiam que a queda nas bolsas de valores pudesse ser seguida pela paralisia dos mercados de capitais, o que faria com que diversos fatores de risco se tornassem não modeláveis por um ano inteiro.
A análise da Refinitiv destacou que, para muitas delas, a atividade de mercado permaneceu flutuante e, portanto, apesar das condições extremas, o teste permaneceu válido.
Aspectos regulatórios
Apesar de o texto global da FRTB ter sido finalizado há cerca de dois anos, ainda há muito trabalho a ser feito para definir os detalhes técnicos em nível local. Algumas jurisdições, como a União Europeia, já fizeram progressos significativos, propondo projetos de normas técnicas; outras, no entanto, ainda têm muito esforço pela frente.
E o problema é que a definição de padrões técnicos em nível local traz riscos de divergências de regras entre as jurisdições.
Uma área de grande incerteza é a definição de cotações comprometidas. O Comitê de Supervisão Bancária de Basiléia (BCBS) especifica: “um preço de um provedor com isenção de interesses pelo qual o provedor da cotação deve comprar ou vender o instrumento financeiro”.
No entanto, a UE tem uma opinião diferente, e atualmente propõe que as cotações tenham o lance e a oferta no mesmo dia. Essa definição é inconsistente com as convenções de mercado para alguns produtos. Por exemplo, muitos mercados tradicionais de balcão (OTC) usam um protocolo de solicitação de cotação (RFQ), no qual os clientes podem especificar se desejam comprar ou vender o instrumento, e os revendedores respondem com uma cotação unilateral.
Outro ponto que tem gerado polêmica é o tratamento do piso de capital, que poderia limitar os benefícios da implementação da abordagem de modelos internos (IMA). Aqui, a UE está contemplando uma interpretação potencialmente mais fraca da regra, que pode beneficiar os bancos que receberam a aprovação da IMA.
E, por último –mas não menos importante—, vemos ainda pouca clareza sobre como as evidências de transações ou cotações comprometidas usadas em RFET devem ser disponibilizadas aos supervisores.
Quais são os próximos passos?
A União Europeia espera finalizar as normas técnicas do IMA ainda no primeiro trimestre, antes de entrar no Official Journal, em meados de 2021.
A regulamentação entraria em vigor três anos depois, no meio de 2024. No entanto, antes disso, os requisitos de relatórios padronizados entrarão em vigor, o que significa que muitas empresas estão tentando colocar o básico em funcionamento até setembro de 2021.
Em contraste, nos EUA, ainda não temos um projeto de regras domésticas. Mas, esperançosamente, 2021 será o ano em que ele deve se materializar, antes que o Fed dê início aos exames de preparação. Assim, o banco central poderá realizar a aprovação do modelo a tempo de entrar em operação em janeiro de 2023. Será fundamental ver se os EUA seguem o exemplo da UE em tópicos como orçamentos comprometidos e prazos de implementação ou se permanecerá fiel ao texto do BCBS.
Comece a se preparar já!
Enquanto trabalhamos para que a FRTB entre em operação, há ainda muito a ser feito para garantir o compliance, especialmente para bancos que buscam a aprovação da IMA. Em relação à origem dos dados, vale a pena pensar em:
- A curto prazo: Tenho os dados de que preciso para a abordagem padronizada, como índices e constituintes de fundos, além de dados de pesos para apoiar a análise das obrigações?
- A médio prazo: Como vou obter dados suficientes de negociações executadas e cotações comprometidas para evitar requisitos de capital excessivos em uma abordagem de modelos internos (IMA)?
Em ambos os casos, a implementação pode demorar mais do que muitas organizações prevêem. Portanto, quanto antes começarem, mais cedo evitarão problemas de compliance.
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