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O impacto da eleição nos EUA sobre o preço do ouro

Saida Litosh
Saida Litosh
Manager - Precious Metals Demand, Europe & Americas, Refinitiv

Com a proximidade das eleições presidenciais norte-americanas, o time de Metals Research da Refinitiv analisa como a cotação do ouro deve se comportar nesta reta final e após os resultados das urnas.


As eleições presidenciais dos EUA desempenham um papel crucial não apenas na definição do futuro da maior economia do mundo, mas no panorama político global. Trata-se de um acontecimento que concentrará as atenções dos principais mercados financeiros –e entre eles, claro, o de metais— ao longo das próximas semanas.

Não há dúvida de que veremos um aumento da volatilidade nos mercados de ações nesta reta final da corrida, além de investidores em busca dos tradicionais portos seguros, como o ouro, sobretudo se a disputa entre os dois candidatos se mostrar muito apertada e crescer o risco de um resultado contestado na Justiça.

Mas, pensando no preço do ouro, será que realmente importa o partido que estiver na Casa Branca?

Oscilação do ouro nos quatro anos seguintes a cada uma das eleições norte-americanas desde 1988

Source: Refinitiv Datastream

Análise das cotações

Um olhar mais atento sobre os movimentos históricos do preço do ouro após eleições presidenciais realizadas nos EUA sugere que não há uma relação clara entre a cotação da commodity e qual partido ocupa a presidência.

Conforme vemos no gráfico acima, o metal parece ter registrado anos melhores e piores sob a liderança de ambos os partidos –e até apresentou desempenho bastante diferente sob a mesma administração em dois mandatos sucessivos.

Embora não se possa ignorar completamente o papel da política, são as condições macroeconômicas presentes em um momento específico que parecem influir mais na oscilação dos preços do ouro, em especial no curto e médio prazo.

E 2020 não foi exceção nesse sentido. Testemunhamos uma recuperação espetacular do valor da commodity neste ano, impulsionada pela desaceleração econômica causada pela pandemia, robustos pacotes de estímulo introduzidos por governos –que provavelmente se traduzirão em expectativas inflacionárias crescentes—, ambiente de baixas taxas de juros e crescentes tensões geopolíticas. Todos esses fatores fizeram com que o preço do metal em dólar atingisse um novo recorde durante os meses de verão.

Um coquetel de incertezas

Mesmo sem nenhuma evidência clara de relação linear entre a cotação do ouro e o resultado das eleições, há algo que já sabemos: as eleições de novembro irão adicionar muita incerteza a estes tempos já difíceis de pandemia.

Os investidores estão cada vez mais preocupados com o impasse iminente entre o presidente Donald Trump e o candidato democrata Joe Biden, que pode levar a um resultado eleitoral incerto, sem um vencedor claro nos momentos seguintes à eleição.

O esperado aumento no número de cédulas enviadas pelo correio, como forma de prevenção à Covid-19, pode gerar ainda mais confusão e atrasos nos resultados. E, em meio a esse quadro sombrio, os comentários do presidente Trump sobre não aceitar uma transferência pacífica de poder em caso de derrota nas urnas só despejam mais gasolina em um ambiente já bastante inflamável.

As notícias recentes sobre o diagnóstico de Covid-19 de Trump também adicionaram novas incertezas às semanas finais da corrida presidencial, contribuindo para acirrar a disputa devido ao provável aumento da simpatia do público pelo presidente em exercício.

Nesta época de crise sanitária e incerteza econômica sem precedentes, essas eleições devem adicionar mais volatilidade ao mercado de ações e pesar sobre o sentimento de risco dos investidores. E isso, por sua vez, favorecerá os portos seguros tradicionais, como o ouro, ao mesmo tempo em que deve prejudicar o desempenho dos metais industriais.

Mercado de ouro: o que vem pela frente

A pergunta que não quer calar é: realmente importa quem vai acabar na Casa Branca?

Se o passado servir como evidência de alguma coisa, podemos dizer que um segundo governo Trump seria pelo menos tão turbulento e polarizador quanto o primeiro, adicionando mais volatilidade e incerteza, embora o potencial para políticas radicais possa ser menor no segundo mandato se o Congresso se mantiver dividido.

Por outro lado, uma vitória de Joe Biden representaria um retorno a uma administração mais convencional, com a ambição de restaurar a posição multilateral anterior dos EUA na política externa, o que, presumivelmente, resultaria em menos volatilidade ligada a riscos políticos e tensões internacionais.

Embora os dois candidatos exponham visões radicalmente diferentes sobre o futuro da maior economia do mundo –desde políticas domésticas até o papel dos Estados Unidos na arena global e mudanças climáticas—, o foco de curto e médio prazo, não importa qual seja o do resultado das eleições, será o combate à crise deflagrada pela Covid-19 e o estímulo à recuperação econômica.

Qualquer que seja o resultado das urnas, a atual política de gastos fiscais maciços e taxas de juros ultrabaixas deverá permanecer em vigor no futuro próximo. Além disso, os dois candidatos são favoráveis ao enfraquecimento do dólar e, sob a administração de Biden, a moeda norte-americana ainda estaria menos exposta à volatilidade associada a riscos geopolíticos.

Ao mesmo tempo, as perspectivas de tarifas menores e acordos comerciais construtivos de um governo democrata podem levar o dólar a se desvalorizar ainda mais.

Em ambos os cenários, a economia deve enfrentar uma recuperação longa e acidentada. E a recuperação pós-Covid-19 ainda pode ser mais fraca sob um governo Biden em razão dos aumentos de impostos prometidos e foco em um crescimento sustentável.

Portanto, para concluir, seja quem for o presidente, é importante enfatizar que as condições macroeconômicas subjacentes, como ambiente de baixa taxa de juros, tensões em curso entre EUA e China, aumento das expectativas inflacionárias e mesmo uma segunda onda de Covid-19, permanecem altamente favoráveis ​​para o ouro no médio e longo prazo.

É no curto prazo, no entanto, que veremos maior volatilidade, negociações instáveis ​​e flutuações nos mercados de ações e no preço do ouro.

Diante de tudo isso, mesmo que vejamos o metal se consolidando ou sendo encurralado em meio a um amplo movimento de venda no curto prazo, ele deve se beneficiar dos riscos crescentes em torno das eleições dos EUA. E não se surpreendam se nos depararmos com um novo recorde de preço antes mesmo do final do ano.

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