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O setor de infraestrutura está pronto para a descarbonização?

Rod Morrison
Rod Morrison
Editor of Project Finance International na Refinitiv

Nos últimos anos, temos visto uma disponibilidade cada vez maior de capital para apoiar iniciativas de emissões líquidas zero. Mas há ativos de qualidade suficientes para atender a essa demanda?


  1. Um dos principais focos da cúpula das Nações Unidas sobre a crise climática global (COP26), que aconteceu entre 31 de outubro e 12 de novembro em Glasgow, foi o investimento em uma nova infraestrutura verde –e isso é uma ótima notícia para os financiadores internacionais de projetos.
  2. Entretanto, muitas das estruturas verdes ainda não estão prontas para ser colocadas em uso.
  3. Ansiosos por transformar a infraestrutura em uma nova classe de ativos, vários investidores estão apostando em projetos de transição, como os de GNL.

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Acabamos de divulgar um novo relatório que aborda questões relacionadas à COP26 e inclui dados climáticos, com gráficos proprietários do Refinitiv Datastream e da Fathom Consulting.

Este artigo foi publicado originalmente no Project Finance International (PFI)*, em 2 de novembro de 2021.

Pouco antes do início da COP26, o governo do Reino Unido, anfitrião da vez, apresentou suas credenciais em um documento de 368 páginas intitulado “Estratégia Líquida Zero: Reconstruir Mais Verde” (na tradução para o português), em que explica como o país pode chegar a emissões líquidas zero até 2050.

Para isso, seria preciso gastar mais de £ 60 bilhões por ano nos próximos dez anos, já que só para descarbonizar o setor elétrico até 2035 seriam necessários entre £ 285 bilhões e £ 400 bilhões.

Mas como isso será feito? Bem, o dinheiro até pode estar lá, mas os projetos certamente não estão –não por enquanto e muito menos na escala necessária.

Em um recém-publicado artigo em que analisa o documento do governo do Reino Unido, Darryl Murphy, chefe de infraestrutura da Aviva Investors, um das maiores empresas de investimento do Reino Unido, disse: “Uma grande vantagem para o governo é a quantidade crescente de capital nacional e internacional disponível para apoiar iniciativas de emissões líquidas zero. Mas a grande questão é se haverá ativos de qualidade suficientes para atender a essa demanda ”.

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Energia eólica offshore saindo na frente

O documento apresenta apenas um setor de emissões líquidas zero que já estaria pronto para o mercado de capitais: o de energia eólica offshore.

Mas, enquanto o armazenamento de longo prazo, a eficiência energética e os veículos elétricos (EV) já estão trilhando esse caminho, outras áreas, como a de hidrogênio e de captura e armazenamento de carbono (carbon capture and storage ou CCS) ainda se encontram nos estágios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) ou, quanto muito, de protótipos.

Assim, é necessário muito investimento adicional em setores que envolvem tecnologia em estágio inicial ou em mercados onde não há demanda definida. “Isso exige que os investidores financeiros trabalhem em conjunto com os patrocinadores industriais e governos. Só dessa forma será possível transformar esses mercados de tecnologias em estágio inicial em tecnologias maduras”, explica Darryl Murphy.

Como já dissemos aqui neste blog, investir é uma coisa, mas pagar a descarbonização por meio de impostos ou de aumento da tarifa para o consumidor é outra bem diferente. No entanto, a combinação de financiamento público e privado foi outra das metas estabelecidas pela COP26.

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Nações desenvolvidas prometem investir na descarbonização de economias emergentes

Durante a COP26, o Japão disse que se comprometeria com US$ 10 bilhões extras nos próximos cinco anos para ajudar a cumprir com a meta anual de US$ 100 bilhões dos países desenvolvidos de investir em projetos de descarbonização de mercados emergentes até 2020 (meta que agora ficou para 2023).

O enviado especial dos EUA para questões climáticas, John Kerry, disse que o compromisso do Japão “tem a capacidade de alavancar financiamento, levantando do Banco Mundial e de outras fontes outros US$ 8 bilhões” –ou seja, US$ 10 bilhões por ano.

Estamos falando aqui de um certo índice de alavancagem público/privado, mas desde que resolveu reagir à iniciativa Belt & Road da China, o Japão se tornou um financiador internacional líder tanto de fundos estatais quanto de comerciais.

Há uma enorme quantidade de idéias para novos projetos, e quase todas requerem financiamento público para o pontapé inicial.

As soluções lideradas pelo mercado são, portanto, bem empolgantes.

A Air Products, líder global na produção de hidrogênio cinza, provavelmente não agrada a todos. Porém, a empresa tem gastado muito em soluções de hidrogênio verde e azul (US$ 7 bilhões na Arábia Saudita e US$ 4,5 bilhões na Louisiana). Além disso, seus projetos não estão esperando para serem estruturados nem por concessões ou subsídios; já estão prontos para uso.

Projetos de hidrogênio rastreados pelo Infraestrutura 360

A estrutura de hidrogênio verde saudita pode sair do papel já no início de 2022, e a “decisão final de investimento” (FID, na sigla em inglês) para a produção de hidrogênio azul da Louisiana já foi aprovada.

E o mercado? Estará pronto quando esses projetos entrarem em operação em 2025/26?

O esquema saudita dependerá de novos mercados de transporte, e o da Louisiana, da substituição do mercado cinza pelo azul.

Investidores em infraestrutura de olho no setor de energia

Parece que faz muito tempo que a British Gas –antes mesmo de ser comprada pela Shell— começou a falar em vender os ativos de infraestrutura associados ao seu empreendimento Queensland LNG. Afinal, como um player global menor do setor de gás, precisava reciclar seu capital.

Agora, essa abordagem se tornou norma. Isso permite, por um lado, que os investidores aloquem grandes quantidades de capital em infraestrutura e, por outro, que as empresas de energia reciclem capital mais rapidamente para investir em novos projetos ou setores, como de energias renováveis. Organizações como a EIG e a GIP, por exemplo, pretendem investir atualmente US$ 5 bilhões em negócios de GNL na Austrália.

Esse movimento também vem ganhando força na região do Golfo. A BlackRock foi uma das primeiras a chegar, adquirindo em 2019 40% de participação no oleoduto da ADNOC por US$ 4 bilhões juntamente com a KKR.

Já outros investidores –entre eles GIC, Ontario Teachers ‘Pension Plan Board e NH Investment & Securities— compraram posteriormente 47% dos gasodutos da ADNOC (por US$ 10 bilhões), enquanto a EIG pagaria US$ 12,4 bilhões por uma participação nos oleodutos da Aramco.

E a GIP? Bem, aparentemente, a empresa não fará propostas para o próximo negócio, os gasodutos Aramco, mas diz que vê oportunidades de investimento em infraestrutura de petróleo, gás e ativos de GNL no Catar, Kuwait e Omã.

Como se vê, o dinheiro está aí, à espera de novas oportunidades no setor.

* Incorporado ao aplicativo Infrastructure 360, o Project Finance International (PFI) é a maior fonte de inteligência global em financiamento de projetos, acompanhando todo o “ciclo de vida” das negociações, desde as notícias iniciais até as análises pós-conclusão. Explore o que você pode ganhar com o Infrastructure 360.